Por Cláudia Pereira //
Meu amigo Jorge esteve na minha casa ontem a noite. Uma vez por semana, dormimos juntos e aproveitamos para ter horas agradáveis . Falamos...fumamos... bebemos coca-cola... e aproveitamos os intervalos para tomarmos banho... trocar de roupa... escovar dentes. Enquanto isso, o outro tagarela sobre qualquer assunto... o traseiro de Beyoncé... o novo livro de Anne Rice... sobre a marca do sabonete...
Poucas pessoas me fazem sentir tão a vontade quanto meu amigo. Ao lado dele não preciso ser falsa...nem risonha... é como se eu desligasse todos os dispositivos e relaxasse, simplesmente porque me sinto amada e aceita como sou.
Ele não me cobra presença. Não me cobra aparência. Não me pede nada em troca. Não mede confidências. Não esconde segredos e quando eles existem...os revelamos com toda a certeza de que seremos compreendidos.
E esta amizade que nos une é o meu suporte....é uma segurança....pois existem poucas pessoas com as quais me sinto realmente à vontade. Infelizmente, não consigo ser eu mesma sempre....me vejo observando... deixando de falar o que realmente sinto... apenas porque aprendi que nem sempre devemos expressar nossos reais sentimentos.
Jorge é tão parecido comigo... que é comum eu entender a sua repugnância diante de determinadas situações, porque o medo dele também é o meu... porque a limitação dele... é a minha... porque... somos naturalmente ansiosos... desconfiados... e nervosos em relação a este país que habitamos.
Ao lado dele tudo fica delicioso....ouvir uma música nova...assistir um novo capítulo daquele seriado....ler poemas em voz alta... dormir lado a lado... dividindo uma cama... e um ar gelado.
E as coisas que não gostamos tb são as mesmas. Samba... MPB... multidão... barulho... pessoas nos tocando... praia... pose... Paulo Coelho... hipocrisia... mediocridade......
Dizem que ele é um cara difícil de gostar. A maioria das pessoas o considera esquisito demais.....mas é por isso mesmo que ele é tão importante pra mim. Se Jorge fosse comum.... seria apenas mais um rosto na multidão, e qual é a graça de ser igual a todo mundo???
As pessoas que me intrigam...são aquelas que quero por perto. Porque o simplório tem aparência de morte.... é gelo que derrete em contato com a areia movediça. E eu .só me sinto realmente verdadeira...quando consigo ser quem sou. Porque estou cansada de fingir coisas.... estou exausta de mascarar sentimentos.... estou cansada de ser agradável..... Porque as vezes.... preciso respirar.... me afastar e pensar se vale a pena fingir.... mesmo que isso me deixe marcas... mesmo que isso me faça perder amores... amigos... parentes.... quero ser dona da minha história....e fazer um caminho próprio para o que chamo de vida.
Depois de viver anos presa às obrigações, quero ter o direito de não sorrir quando tenho vontade...e deixar claro que nem sempre estou feliz.... que as vezes fico triste... e quero chorar... sofrer em silêncio... longe de quem me vem com questionamentos bobos : “nossa... mas vc não é assim.... nunca te acho melancólica....”
A máscara que uso parece ser perfeita.... mas..... de um tempo pra cá....já consigo ser uma pessoa menos preocupada em agradar.... e até deixo claro quando não estou satisfeita com o outro.
Parece que aprendo a viver agora. Lá fora todo mundo parece satisfeito com algo que eu ainda não sei bem o que é.... mas sinceramente.... quero trancar a minha porta....e ficar no meu mundo em preto & branco.... longe das polaroids.... e da magnífica tela do CINEMARK.
Como canta Aimee Mann em Lost in Space:
So baby beware/I’m just pretending to care/ like I’m not even there/gone, but I don’t know where (então, baby preste atenção/ Eu estou apenas fingindo me importar/ Como se eu não estivesse lá/ Distante, mas sem saber em que lugar).
Texto republicado, para o nosso querido amigo Jorge! (Saudades do padrinho...)
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